domingo, 30 de março de 2014

Dois pesos, duas medidas

Por Rodrigo Viana/Revista Imprensa Ed. 298

E foi-se Santiago, repórter cinematográfico que fez uma nação gritar em torno de sua morte bestial, horrorosa e desprezível.

Tão desprezível quanto o silêncio quase geral sobre a omissão da empresa de comunicação em que ele trabalhava em torno do fato. Por que a emissora não disponibilizou máscaras de gás, colete, um assistente e outros requisitos básicos de segurança para o profissional?

Há alguns meses, o mesmo grupo de comunicação abarrotou seus intervalos comerciais com um editorial apoiando os 12 corintianos presos injustamente (?) na Bolívia, acusados de morte do garoto Kevin Spada. Os 12 foram soltos, o garoto morreu e os pais choraram no meu ombro. Literalmente. Estive lá, entrevistei a família e chorei junto. Os criminosos da torcida organizada já brigaram outras vezes, invadiram o CT do Corinthians, ameaçaram outras pessoas de morte e nada. Nada aconteceu.

Nada aconteceu também com o filho do empresário Eike Batista, que, em alta velocidade, atropelou e matou um homem no Rio de Janeiro em 2012. Não ficou preso um dia sequer. Foi condenado e sua pena - dois anos de prisão - foi convertida em serviços comunitários. Devo dizer que o filho do empresário também pagou uma multa de um milhão de reais. E todas, todas as grandes emissoras de televisão calaram sobre o assunto.

No começo de fevereiro, o jogador de futebol do Cruzeiro, Tinga, foi vítima de racismo num jogo do clube mineiro no Perú. A gritaria, novamente, foi geral. Mas será que o grito contra o racismo do dia a dia aqui no Brasil é o mesmo?

Lembro-me da tragédia do Morro do Bumba, em Niterói, no ano de 2010. Morreram 267 pessoas na favela construída sobre um lixão. Somente 48 corpos foram encontrados, a maioria gente de raça negra ou miscigenada, nordestinos e imigrados de zonas de extrema pobreza. A quem interessava divulgar, procurar culpados, encontrar os corpos?

Vou deixar a história mais clara.

Em janeiro de 2012, na boate Kiss em Santa Maria, 233 jovens morreram em incêndio. Eram de classe média ou alta, numa região de predominância branca, de etnia italiana ou alemã. Nesta segunda tragédia, os jornais pediram insistentemente a apuração imediata das responsabilidades. É preciso parar para pensar sobre o tratamento que a mídia dá aos relatos de eventos escandalosos e brutais que atingem os cidadãos, independentes de serem ricos ou pobres ou de trabalharem no governo, numa construção, na padaria ou numa emissora de televisão.


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