Professor especialista de comunicação organizacional em relações públicas deu palestra na última quarta-feira (11) no auditório da COMUNICA da UFRN sobre o desafio que a mídia terá daqui em diante com o público
Se você já teve a impressão de estar assistindo TV ou lendo um jornal e mesmo assim não se sentir inserido naquilo que está sendo dito, acredite, não é apenas um problema seu. É uma tendência que tem a mídia como principal responsável. Ela pouco despertou à cidadania e dar voz a quem não tem. Mais que isso, ao dar uma notícia não se contextualiza com o ambiente em questão e não levanta questões de interesse direto da sociedade como por exemplo o quanto o orçamento familiar pode ser comprometido com aquele sobe-desce de números na economia ou o custo e a demora daquela grande obra que o político apresenta como inconteste, e ainda fiscalizar o porquê a praça feita com tanto murmúrio está sem manutenção . Ou seja, não basta apresentar os fatos, mas indagar em que eles vão interferir na vida das pessoas.
Foi nesse contexto que o professor Paulo Celestino da Costa Filho, especialista em comunicação organizacional em Relações Públicas pela Escola de Comunicação e Artes (ECA-USP), falou sobre a possibilidade de se fazer um jornalismo cada vez mais público com o advento e a liberdade que as novas tecnologias disponíveis estão dando para os cidadãos serem cada vez mais participantes na construção de civilidade, sem se desgarrar da qualidade da informação e dos princípios básicos do bom jornalismo, como: checagem, pesquisa e responsabilidade. “O Jornalismo Público e o Futuro da Informação – A nova relação entre mídias e públicos”, foi sua tese de mestrado em 2003 e mostra como surgiu, o caso brasileiro e como está sendo usado o jornalismo público.
A origem do jornalismo público – o momento norte-americano
No início da década de 1990, um grupo de jornalistas (chamados de “jornalistas conscientes”) e especialistas de algumas universidades ficaram incomodados com a crise que a mídia estava vivendo e decidiram se reunir para pensar e analisar como essas organizações estavam tratando seus conteúdos jornalísticos.
O resultado, como era esperado, mostrou uma mídia despreocupada com conteúdos a serem apresentados, deixando claro que a falta de qualidade na programação afetava o desempenho de algumas emissoras. Nos meios impressos, o pragmatismo do lide e da pirâmide invertida tirava a criatividade dos jornalistas, deixando textos cristalizados, já que as principais informações eram possíveis de serem lidas em manchetes ou em rápidas passagens pela notícia sem dar valor aos detalhes, estes que na maioria das vezes revela o que está escondido.
Com isso, declinam os números de leitores e assinantes de jornal nos EUA, fruto do interesse da população por algo diferente do habitual. O que rendeu a necessidade de se fazer um jornalismo não apenas público, como também cívico.
Motivações do jornalismo cívico
Esses pesquisadores identificaram seis tipos de crises do jornalismo. A saber:
- econômica: a baixa qualidade afetou a relação entre empresa-anunciante, já que o número de pessoas que compram jornais vem caindo.
- tecnológica: mudança de paradigma da mensagem. Passou da direção “um para muitos”, para “muitos para muitos”.
- política: a mídia mais como problema do que solução. O falso discurso da imparcialidade se faz identificar a baixa adesão política, mostrando pouco engajamento cívico.
- espiritual: dizem saber muito bem do que são contra, mas não demonstram o que são a favor. A rede de televisão CNN mostrou a primeira guerra televisionada da história (Guerra do Golfo) com excessos de abusos dos jornalistas a mostrarem apenas os momentos em que os EUA estavam vencendo a guerra, quando, na verdade, estavam perdendo.
- existencial: dúvida se nivelar a programação por baixo seria melhor forma de unificar a audiência
- intelectual: conceitos-chave clássicos do jornalismo sendo questionados, como por exemplo, “quanto mais informação melhor” e o lide.
O Jornalismo Público no Brasil
Dez anos depois de aparecer nos EUA, chega o jornalismo público no Brasil. Mas, não seguiu a cartilha norte-americana, não está conseguindo ser pública, muito menos cívico.
A razão é por vários motivos. Primeiro por conta da legislação brasileira que trata da Comunicação Social. Ela dá brechas na lei para que os horários de produção de conteúdo voltada para as comunidades sejam flexíveis. Com isso, há uma preferência pelo lado comercial durante boa parte da programação das TVs privadas. Estas que tiveram suas concessões de Rádio e TV concedidas durante a chamada “farra das concessões” a amigos políticos em todo o Brasil do então Presidente da República em 1988, José Sarney.
O outro problema é o questionamento do que são realmente as TVs públicas no Brasil. Atualmente são duas: TV Cultura e TV Brasil. A primeira, atualmente e crise e pertencente a Fundação Padre Anchieta, de São Paulo é acusada de não fazer escolhas políticas muito corretas e, assim, não ser livre no seu modelo de gestão. Já a TV Brasil, alguns dizem parecer mais um porta voz do governo do que do povo, passando a ser pública para ser estatal.
A Linguagem absorvida – as ONGs
Para exemplificar como o jornalismo público está sendo usado, peguemos o caso das ONGs. Elas estão absorvendo a linguagem jornalística para produzir conteúdos. Assim, deixam de ser meras fontes e passam a ser mediadoras. Criam sites, jornais, newsletters e algumas até fazem reportagens da própria instituição.
Novas Ecologias da Informação
Está havendo deslocamentos da produção e emissão de informação. A midiaesfera (blog e microblog) se ampliou, sendo muita gente capaz de disseminar conteúdos.
Também está havendo deslocamento da recepção. Não é mais necessário ficar na frente da TV com hora marcada para ver o que deseja. Os downloads de vídeos dão ao usuário a flexibilidade de baixar o conteúdo e vê-lo a hora que quiser.
Em qualquer tempo e lugar será possível dar o “furo”. É bem capaz que uma notícia ou fato seja dado em primeira mão por um cidadão, leitor, espectador. O desafio é achar notícias locais valiosas em um mundo que as mensagens muitas vezes são unilaterais.
Fim do Jornalismo?
Não. Apesar da tendência ser um jornalismo público/cívico/colaborativo com comprometimento do desenvolvimento local e com a realidade social, o agentes públicos e jornalistas devem atuar juntos. Até para valorização deste último, deve-se criar mecanismos de interação entre os detentores de informação,como por exemplo em forma de trocas de mensagens eletrônicas, dando voz ao cidadão reivindicar para que o jornalista vá no local conferir . Outra maneira de interação é criar espaços para a sociedade, um telejornal pode abrir um tempo diário para que as pessoas enviem fotos, vídeos e textos para serem exibidos como flagra, notícia, alerta ou convite para ir até o local para conferir de perto.
Assim nada irá se perder. O cidadão pode fazer a notícia e o jornalista pode checar, analisar e conferir a veracidade. Não existe fórmula pronta, mas deve existir comprometimento com a informação bem feita, tão perdida nesses tempos de imagens e pressa. Agora é experimentar, e muito.
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