Por Rodrigo Viana/Revista Imprensa Ed. 298
E foi-se Santiago, repórter cinematográfico que fez uma nação gritar em torno de sua morte bestial, horrorosa e desprezível.
Tão desprezível quanto o silêncio quase geral sobre a omissão da empresa de comunicação em que ele trabalhava em torno do fato. Por que a emissora não disponibilizou máscaras de gás, colete, um assistente e outros requisitos básicos de segurança para o profissional?
Há alguns meses, o mesmo grupo de comunicação abarrotou seus intervalos comerciais com um editorial apoiando os 12 corintianos presos injustamente (?) na Bolívia, acusados de morte do garoto Kevin Spada. Os 12 foram soltos, o garoto morreu e os pais choraram no meu ombro. Literalmente. Estive lá, entrevistei a família e chorei junto. Os criminosos da torcida organizada já brigaram outras vezes, invadiram o CT do Corinthians, ameaçaram outras pessoas de morte e nada. Nada aconteceu.
Nada aconteceu também com o filho do empresário Eike Batista, que, em alta velocidade, atropelou e matou um homem no Rio de Janeiro em 2012. Não ficou preso um dia sequer. Foi condenado e sua pena - dois anos de prisão - foi convertida em serviços comunitários. Devo dizer que o filho do empresário também pagou uma multa de um milhão de reais. E todas, todas as grandes emissoras de televisão calaram sobre o assunto.
No começo de fevereiro, o jogador de futebol do Cruzeiro, Tinga, foi vítima de racismo num jogo do clube mineiro no Perú. A gritaria, novamente, foi geral. Mas será que o grito contra o racismo do dia a dia aqui no Brasil é o mesmo?
Lembro-me da tragédia do Morro do Bumba, em Niterói, no ano de 2010. Morreram 267 pessoas na favela construída sobre um lixão. Somente 48 corpos foram encontrados, a maioria gente de raça negra ou miscigenada, nordestinos e imigrados de zonas de extrema pobreza. A quem interessava divulgar, procurar culpados, encontrar os corpos?
Vou deixar a história mais clara.
Em janeiro de 2012, na boate Kiss em Santa Maria, 233 jovens morreram em incêndio. Eram de classe média ou alta, numa região de predominância branca, de etnia italiana ou alemã. Nesta segunda tragédia, os jornais pediram insistentemente a apuração imediata das responsabilidades. É preciso parar para pensar sobre o tratamento que a mídia dá aos relatos de eventos escandalosos e brutais que atingem os cidadãos, independentes de serem ricos ou pobres ou de trabalharem no governo, numa construção, na padaria ou numa emissora de televisão.
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domingo, 30 de março de 2014
Dois pesos, duas medidas
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segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012
O Brasil que não se vê na TV
Por Laurindo Lalo Leal Filho
O Brasil que se vê na TV está restrito ao Rio e à São Paulo, salvo raras exceções. Exibem-se nas novelas e nos telejornais, lindas paisagens e graves problemas urbanos dessas metrópoles para todo o país.
Fico a me perguntar o que interessa ao morador de Belém o congestionamento da Marginal do Tietê, exaustivamente mostrado pelas redes nacionais de TV? Não haveria fatos locais muito mais importantes para a vida dos telespectadores do Pará do que as mazelas da capital paulista?
No entanto, o conteúdo que vai ao ar não é determinado pelos interesses ou necessidades do telespectador e sim pela lógica comercial. Para o empresário de TV local é mais barato e mais lucrativo reproduzir o que a rede nacional de televisão transmite, inserindo alguns comerciais da região, do que contratar profissionais para produzir seus próprios programas.
Para as grandes redes trata-se de uma economia de escala: com um custo fixo de produção, o lucro cresce à medida em que os anúncios são veiculados num número crescente de cidades.
Isso ocorre porque como qualquer outra atividade comercial a lógica do capital é a da concentração, regra da qual a televisão, movida pela propaganda, não escapa. Só que a TV não é, ou não deveria ser, apenas um negócio como outro qualquer.
Por transmitir valores, idéias, concepções de mundo e de vida, ela é também um bem cultural e não uma simples mercadoria. Dai a necessidade de ser regulamentada e ter os seus serviços acompanhados de perto pela sociedade.
Como concessões públicas, as emissoras têm obrigação de prestar esses serviços de maneira satisfatória, atendendo às necessidades básicas de informação e entretenimento a que todos tem direito. Caso contrário, caberiam reclamações, processos e punições, como ocorre em quase todas as grandes democracias do mundo.
Aqui, além de não existirem órgãos reguladores capazes receber as demandas do público e dar a elas os devidos encaminhamentos, não temos uma legislação capaz de sustentar esse processo. Por aqui vale tudo.
E quem perde é a sociedade, empobrecida culturalmente por uma televisão que a trata com desprezo. Diretores de emissoras chegam a dizer, preconceituosamente, que “dão ao povo o que o povo quer”.
Um caso emblemático da falta que faz essa legislação é o da produção e veiculação de programas regionais. Se o mercado concentra a atividade televisiva no eixo Rio-São Paulo, cabe a lei desconcentrá-lo, como determina artigo 221 da Constituição, até hoje não regulamentado.
Sua tramitação é seguidamente bloqueada no Congresso por parlamentares que representam os interesses dos donos das emissoras de TV.
Em 1991 a então deputada Jandira Feghali apresentou um projeto de lei estabelecendo percentuais de exibição obrigatórios para produção regional de TV no Brasil. Doze anos depois, em 2003, após várias concessões feitas para atender aos interesses dos empresários, o texto foi aprovado na Câmara e seguiu para o Senado, onde dorme um sono esplendido até hoje.
São mais de vinte anos perdidos não apenas para o telespectador, impossibilitado de ver o que ocorre na sua cidade e região. Perdemos também a oportunidade de abrir novos mercados de trabalho para produtores, jornalistas, diretores, atores e tantos outros profissionais obrigados a deixar suas cidades em busca de oportunidades limitadas nos grandes centros.
Mas se os interesses empresariais das emissoras bloqueiam esse florescimento artístico e cultural, as novas tecnologias estão abrindo brechas nessas barreiras. O barateamento e a diminuição dos equipamentos de captação de imagens impulsionaram o vídeo popular e a internet vem sendo um canal excelente de divulgação desses trabalhos.
Combina-se a vontade e a capacidade de fazer televisão fora das emissoras tradicionais com a necessidade do público de acompanhar aquilo que acontece perto de sua casa ou de sua cidade.
O que não descarta a necessidade da existência de programação regional nas grandes emissoras, como forma de tornar o Brasil um pouco mais conhecido pelos próprios brasileiros.
O Brasil que se vê na TV está restrito ao Rio e à São Paulo, salvo raras exceções. Exibem-se nas novelas e nos telejornais, lindas paisagens e graves problemas urbanos dessas metrópoles para todo o país.
Fico a me perguntar o que interessa ao morador de Belém o congestionamento da Marginal do Tietê, exaustivamente mostrado pelas redes nacionais de TV? Não haveria fatos locais muito mais importantes para a vida dos telespectadores do Pará do que as mazelas da capital paulista?
No entanto, o conteúdo que vai ao ar não é determinado pelos interesses ou necessidades do telespectador e sim pela lógica comercial. Para o empresário de TV local é mais barato e mais lucrativo reproduzir o que a rede nacional de televisão transmite, inserindo alguns comerciais da região, do que contratar profissionais para produzir seus próprios programas.
Para as grandes redes trata-se de uma economia de escala: com um custo fixo de produção, o lucro cresce à medida em que os anúncios são veiculados num número crescente de cidades.
Isso ocorre porque como qualquer outra atividade comercial a lógica do capital é a da concentração, regra da qual a televisão, movida pela propaganda, não escapa. Só que a TV não é, ou não deveria ser, apenas um negócio como outro qualquer.
Por transmitir valores, idéias, concepções de mundo e de vida, ela é também um bem cultural e não uma simples mercadoria. Dai a necessidade de ser regulamentada e ter os seus serviços acompanhados de perto pela sociedade.
Como concessões públicas, as emissoras têm obrigação de prestar esses serviços de maneira satisfatória, atendendo às necessidades básicas de informação e entretenimento a que todos tem direito. Caso contrário, caberiam reclamações, processos e punições, como ocorre em quase todas as grandes democracias do mundo.
Aqui, além de não existirem órgãos reguladores capazes receber as demandas do público e dar a elas os devidos encaminhamentos, não temos uma legislação capaz de sustentar esse processo. Por aqui vale tudo.
E quem perde é a sociedade, empobrecida culturalmente por uma televisão que a trata com desprezo. Diretores de emissoras chegam a dizer, preconceituosamente, que “dão ao povo o que o povo quer”.
Um caso emblemático da falta que faz essa legislação é o da produção e veiculação de programas regionais. Se o mercado concentra a atividade televisiva no eixo Rio-São Paulo, cabe a lei desconcentrá-lo, como determina artigo 221 da Constituição, até hoje não regulamentado.
Sua tramitação é seguidamente bloqueada no Congresso por parlamentares que representam os interesses dos donos das emissoras de TV.
Em 1991 a então deputada Jandira Feghali apresentou um projeto de lei estabelecendo percentuais de exibição obrigatórios para produção regional de TV no Brasil. Doze anos depois, em 2003, após várias concessões feitas para atender aos interesses dos empresários, o texto foi aprovado na Câmara e seguiu para o Senado, onde dorme um sono esplendido até hoje.
São mais de vinte anos perdidos não apenas para o telespectador, impossibilitado de ver o que ocorre na sua cidade e região. Perdemos também a oportunidade de abrir novos mercados de trabalho para produtores, jornalistas, diretores, atores e tantos outros profissionais obrigados a deixar suas cidades em busca de oportunidades limitadas nos grandes centros.
Mas se os interesses empresariais das emissoras bloqueiam esse florescimento artístico e cultural, as novas tecnologias estão abrindo brechas nessas barreiras. O barateamento e a diminuição dos equipamentos de captação de imagens impulsionaram o vídeo popular e a internet vem sendo um canal excelente de divulgação desses trabalhos.
Combina-se a vontade e a capacidade de fazer televisão fora das emissoras tradicionais com a necessidade do público de acompanhar aquilo que acontece perto de sua casa ou de sua cidade.
O que não descarta a necessidade da existência de programação regional nas grandes emissoras, como forma de tornar o Brasil um pouco mais conhecido pelos próprios brasileiros.
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